E como é que se escreve a alegria? A manhã me cutucou e me coloquei de pé.
Ficou deitada a preguiça, rolando na cama. Atei cada lado da cortina e, quando
pensei que olhava para fora, era o fora quem me olhava. Chamou-me: vem ver a
luz do dia! Passava pouco da madrugada, mas parecia que as horas corriam há léguas em minha frente. Olhei o relógio. Nenhum atraso. Havia um brilho diferente
nos olhos do céu. Era uma festa surpresa – supus. Fui convidada a cantar e
celebrar a vida. De quem? De todos, de tudo.
E como é que se escreve a alegria? Os caminhões estão parados nas vias. Os
homens descarregam suas máquinas. Andam de um lado para o outro. Cores
fluorescentes marcam cones e uniformes. Um homem controla com sua bandeirinha o
tráfego dos pedestres. O barulho dos tratores carregando a terra que foi
revolvida e o som de furadeira do lado de fora compõem a orquestra matutina. O
quarteirão em movimento segue a regência do maestro no meio da rua. E a cidade
muda e o homem nela trabalha.
E como é que se escreve a alegria? A casa cheira a café fresco. Na mesa o
tin tin dos sorrisos, uma música ao fundo que canta junto com a cidade.
Palavras e pães distribuídos. O menino batuca na mesa, depois brinca no chão,
faz pirraça, rola para tudo quanto é canto e segura o tempo em suas mãos.
Balanço a colcha no ar. A luz me ajuda a ver a poeira saindo lentamente.
Estendo a cama com paciência. Junto a roupa para lavar porque hoje tudo quer
ficar novo. Xícaras na pia, chuveiro ligado. A água canta em todo canto. Separo
artigos em minha mesa. Folhas inéditas. As folhas verdíssimas das árvores, as
novas folhas para ler.
E como é que se escreve a alegria? Beijo nos lábios, beijo no rosto.
Despedidas e uma promessa de reencontro ao final do dia. A casa em
silêncio. O barulho que vai durar o dia
inteiro do lado de fora. Gratidão por ambos. Joelhos dobrados, prece de
socorro, porque tudo está apenas no começo. Não me demoro. Que Deus abençoe as
nações, todo o mundo, cada gente, é o chamado de hoje. Os muitos cantos me
convidam. Uma paz de não ter de cuidar de mim. E um desejo sem pé nem cabeça de
colocar para fora o filho chorão.
E como é que se escreve a alegria? Se alguém sabe como não ser romântico, como não ser ridículo, como não parecer ingênuo, por favor, me diga. Se alguém não teme a palavra pobre, a experiência fugidia, o ritmo tropeçante, que me fale. Se alguém consegue não ofender com um sorriso o que sofre ou macular a alegria do que saiu para dançar, dê-me as mãos. Mas, hoje a alegria me chama, amigo. E me faz esse pedido esdrúxulo de escrevê-la. Eu pergunto a ela: mas, como? Ela sacode os ombros, moleca que é, e sai correndo na minha frente, procurando outros olhos carregados de beleza. Respondo contando cada canto. Depois, solto o lápis, continuo a lida.
Enquanto lia tuas respostas a alegria me abraçou na forma de um filho q veio me dar bom dia e se alongou p de baixo das minhas cobertas p me contar um sonho esquisito! Obrigada por compartilhar tuas respostas, despertar a minha e a do outro ao chamado!
ResponderExcluirObrigada você, Sayô. Por embarcar comigo nesse texto.
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